quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Conversas ensaístas, Luiz Carlos Garrocho e Flora Maurício

Luiz Carlos Garrocho e Flora Maurício dividiram a noite de terça-feira, dia 10.01, como propositores do \conversas ensaístas da 4ª semana.

Garrocho começou sua fala destacando a dimensão ensaísta do pensamento crítico, como exercício analítico e criativo ou como experimentações teóricas, sem, contudo, ser demasiadamente abstrato ou rígido. "Não se trata de aplicar o conceito, mas buscar estabelecer relações entre o conceito e as coisas", destacou. "O conceito contra-efetua o acontecimento e te faz levantar perguntas". E sugeriu pensar o conceito com um recuo estratégico.

Sua fala também abordou os trabalhos, as práticas e as reflexões que ele desenvolve com o coletivo "Olho da Rua". Compartilhou algumas linhas que norteam suas ações, como por exemplo: a) a preocupação em compor uma paisagem, ao invés de fazer pose – isto é, levar a performance ou a intervenção urbana para o lado da representação teatral; b) desenvolver uma situação de encontro e convívio com os espaços urbanos – sem criar distanciamento, mas sim, tencionamento; c) compartilhamento de uma duração; d) criação de uma textura – não temática, nem dramática, mas sobretudo situacional. "Pensar que o espaço está em produção. Ele não é fixo".

Nesse sentido, Garrocho propôs muito pensar a ação performática na rua como um constante negociar com as situações espaciais e corporalmente dialógicas. Uma preocupação em despertar uma qualidade no estado de atenção que torne possível transformar os espaços em espaços de crise. Estar disponível para a experiência e o experimento, evitando o excesso de racionalização e representação. Atuar constantemente no campo do tencionamento, no sentido de produzir crises e fissuras que despertem o pensamento para nossa vivência urbana.

Ao final da noite, Flora Maurício faz uma performance vocal. Escutamos sua improvisação nonsense, irônica e provocadora como ouvintes de uma rádio – que éramos, à propósito, convidados a participar embora não nos fosse aberto ou revelado o canal de diálogo. Madame Zoraide faz uma aparição fazendo previsões zodiacais para alguns signos – privilegiados.

Foi interessante vivenciar a escuta coletiva de uma rádio no espaço da galeria. Flora se situou atrás da parede branca de fundo, espaço onde os residentes constumam guardar materiais de performances e alguns pertences e também algo como um depósito do que disponibilizamos para ser usado na galeria. Um tensionamento interessante se pensarmos que em performance falamos sempre de presença física e se pensarmos que a presença sensível que tínhamos de Flora ali era, sobretudo, a sua voz improvisando – sem titubear – um programa radiofônico interativo.

Interessante nesse caso é também pensar essa apresentação em diálogo com o conceito de performance trabalhado por um autor como Paul Zumthor, que aborda a performance oral da poesia improvisacional dos trovadores medievais e, depois, de todo tipo de poesia que se faz a partir da voz viva, sem um texto prévio como guia. Uma voz que cria uma forma poética no espaço. E Zumthor fala muito de copresenças. Dividir o espaço físico de estar juntos e compartilhando os instantes de criação, transmissão e percepção. Por isso, achei muito interessante esse espaço de copresenças ter sido como que tencionado na dimensão visível da presença física de Flora. Ela estava lá, mas só a percebíamos sonoramente.






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